Lineu Ayres: mecânica das rochas e mecânica dos solos compartilham fundamentos. Assista ao vídeo!

Lineu Ayres: mecânica das rochas e mecânica dos solos compartilham fundamentos. Assista ao vídeo!

Comitê Brasileiro de Mecânica das Rochas produziu e apresenta aqui uma série de entrevistas com alguns de seus ex-presidentes. A iniciativa é parte das comemorações dos 75 anos da ABMS e dos 60 anos do CBMR. O entrevistado desta vez é o engenheiro Lineu Azuaga Ayres, ex-presidente do Comitê. A atual presidente, professora Talita Miranda, faz a abertura  do vídeo. Assista aqui.

Trajetória

Lineu Azuaga Ayres, engenheiro geotécnico e ex-presidente do Comitê Brasileiro de Mecânica das Rochas (1994-96) e (2017-2020), é uma personalidade atuante e presente na história da mecânica das rochas no Brasil. Sua trajetória revela uma carreira marcada por paixão pela engenharia, compromisso com a formação acadêmica e uma visão crítica sobre os desafios e o futuro da área.  

Nascido em uma família na qual a engenharia era valorizada, Lineu foi influenciado pelo pai, um engenheiro civil fascinado por minerais. Em 1964, ele ingressou no curso de Engenharia de Minas da Escola Politécnica da USP, uma escolha que quase cedeu espaço a interesses como Direito ou Publicidade. A decisão pela engenharia foi selada após uma visita à Escola de Minas de Ouro Preto, onde o museu mineralógico o encantou. "Foi ali que me decidi", lembra ele, destacando o impacto daquele momento. 

Após se formar em 1968, Lineu iniciou sua carreira na indústria, trabalhando com concreto pré-moldado em edificações industriais. Sua habilidade técnica o levou a se tornar especialista em uma fábrica italiana de estacas, resolvendo problemas crônicos de produção. Paralelamente, em 1973, começou a lecionar na Escola Politécnica como professor em tempo parcial, equilibrando a vida profissional com a docência.  

Foi nesse período que ele se aproximou da mecânica das rochas, influenciado por nomes como Diniz da Gama, Carlos Manoel Nieble e Murilo Ruiz, do Instituto de Pesquisas Tecnológicas (IPT), além do professor Milton Kanji, que ministrava aulas sobre o tema. 

 

 

 

 

 

 

 

Na década de 1980, Lineu tomou uma decisão crucial: abandonar a iniciativa privada para se dedicar exclusivamente à academia. Aceito como professor em tempo integral na Escola Politécnica, ele completou mestrado (1981), doutorado (1988), livre-docência (1993) e tornou-se professor titular em 1999.  

Durante o doutorado, ao utilizar uma prensa moderna na USP de São Carlos, percebeu a necessidade de montar um laboratório de ponta na Poli. Liderou em 1992 a criação do Laboratório de Mecânica das Rochas, obtendo recursos da FINEP, CNPq e do Ministério de Minas e Energia. Com uma prensa servo-controlada da MTS, avaliada então em 500 mil dólares, o laboratório se tornou referência nacional, embora Lineu lamente que a prensa esteja atualmente inativa.

Envolvimento com o CBMR

Seu envolvimento com o CBMR começou a convite de colegas como os professores Kanji e Eda Quadros. Inicialmente colaborador, Lineu foi eleito presidente por dois mandatos, período em que promoveu a integração do CBMR com o Comitê Brasileiro de Túneis (CBT), buscando também aproximação maior com a ABMS.  

Embora nunca tenha participado diretamente da ABMS, ele reconhece a importância da colaboração entre as áreas. 

 

 

 

 

 

 

 

Afirma, uma visão refletida em seus cursos de pós-graduação, que abordam aplicações práticas como estabilidade de taludes, mineração e escavações subterrâneas. 

Lineu é crítico quanto à superficialidade no ensino e na prática da mecânica das rochas. Ele observa que muitos profissionais priorizam o uso de aplicativos que entregam resultados automáticos, negligenciando os fundamentos. "Quem vai a campo coletar dados? Os estagiários sabem o que observar?", questiona, defendendo que o entendimento profundo das propriedades dos maciços rochosos é essencial.  

Sua crítica se estende às classificações de maciços, como as de Bieniawski e Barton, que ele considera métodos específicos, não intercambiáveis. "Chamar de ‘classificação’ é inadequado; são soluções para problemas distintos", explica, enfatizando a importância de compreender os pressupostos de cada abordagem. 

Na prática, Lineu destaca a relevância da mecânica das rochas em projetos complexos. Ele cita, como exemplo, o aprofundamento do canal do Porto de Santos, necessário para receber grandes navios de cruzeiro, no qual analisou o maciço rochoso, sua resistência, o uso de explosivos e os impactos na água do mar. Outro exemplo foi o canal de Vitória (ES), onde o controle de vibrações em áreas urbanas exigiu precisão. "Tudo parte de entender o comportamento do maciço", diz, alertando que falhas nessa análise podem levar a problemas graves. 

Sobre o CBMR, Lineu o vê como uma ponte entre a comunidade técnica e acadêmica, promovendo congressos, estágios e eventos conjuntos. Ele destaca a conexão com a International Society for Rock Mechanics (ISRM), que fortalece a presença brasileira no cenário global. Durante sua gestão, criou o prêmio para a melhor tese de doutorado em mecânica das rochas, com indicação ao Prêmio Manuel Rocha da ISRM. Sobre esse tema, ele sugere resgatar premiações para trabalhos de graduação para engajar estudantes. "Precisamos motivar desde cedo", afirma. 

Lineu reconhece as raízes europeias da mecânica das rochas, impulsionadas por figuras como Leopold Müller e Manuel Rocha, e celebra os pioneiros brasileiros, como Murilo Ruiz e Nieble, que trouxeram esse conhecimento ao país. Ele vê a evolução da área como um processo global de compartilhamento: 

 

 

 

 

 

 

 

 

Futuro da Mecânica das Rochas

Olhando para o futuro, Lineu acredita que a mecânica das rochas ainda tem muito a avançar, tanto em sofisticação técnica quanto em acessibilidade operacional. Ele critica a dependência excessiva de softwares, defendendo que os estudantes mantenham o vínculo com o raciocínio técnico e a realidade das obras.  

Com humor, compara escolhas de vida — estudar, jogar bola, beber — e afirma que a sua foi a mecânica das rochas, a engenharia de minas e a profissão. "O Brasil tem riquezas minerais a explorar e proteger", diz, expressando entusiasmo pelo potencial da área. 

A trajetória de Lineu Ayres é um testemunho de dedicação e impacto. Sua liderança no CBMR, a criação do laboratório na Poli e sua paixão pelo ensino moldaram gerações de engenheiros. Com uma visão que equilibra tradição e inovação, ele continua a inspirar, defendendo uma mecânica das rochas fundamentada, prática e conectada aos desafios do século XXI. 

Assista à entrevista completa: